Tão negra a noite estava,
Tão grande a solidão,
Corria e não escapava
Deste vórtice de humilhação.
Entreguei-me ao sangue de Baco,
Delirei em meios pensamentos.
Em meus olhos um brilho opaco
Anunciava o encerramento.
Andei não mais que um metro
Por entre a praça e o bosque profundo.
Ví tua face iluminada, corri para perto.
Quando cheguei, calou-se o mundo.
Contei-me sobre meus erros,
minha paixões, meu azar e sorte,
Contei-lhe meus devaneios,
Contei também que desejava a morte.
Ouviste calada.
Apenas ouviste.
Na noite nublada
Uma palavra não disseste.
Achando demais
Tal silêncio profundo
Indaguei: "Onde estás,
Voz deste ser mudo?".
Sem resposta, adormeci.
E apenas com o sol acordei.
Abrindo os olhos percebi
Que em seu colo eu deitei.
Mas quando todo o efeito
Do néctar deídico se afastava,
Notei, insatisfeito
O ser que me fitava.
Pois que não era um ser.
Não na essência da palavra.
Era uma estátua, e pude ver
Ainda, que um olho lhe faltava.
Saí de cima
Da gentil escultura,
E pensei: Ó que estima
Tenho pelo nem sequer é criatura.
Deixei-a com seu olhar único
E entalhado.
Me virei, ouvi um ruído.
Me arrependo de ter olhado.
Mas claro era apenas
Uma peça de minha cabeça senil.
Quem são diria com todas as letras:
"Uma estátua para mim tinha falado:
De mim não se esqueças,Ouviu?!".